Hipnose clínica pode potencializar os efeitos da educação em dor?

 
Estudos modernos da neurociência comparam o cérebro com uma orquestra que pode tocar várias músicas, com diferentes ritmos e volumes. A dor é uma dessas diferentes músicas que o cérebro pode tocar. 

Agora, como mudar a atividade do cérebro? 

Como seria se pudéssemos mudar o volume e o ritmo da música-da-dor? Como seria se pudéssemos diminuir o volume e tornar o ritmo dessa música-da-dor menos desagradável? 

Essas perguntas estão tentando ser respondidas através de pesquisas cientificas principalmente para aliviar a condição dolorosa mais comum em nossa sociedade - a dor lombar.

A dor lombar crônica é a condição de saúde que mais gera incapacidade no mundo todo(1). É um problema que gera altíssimos custos para a sociedade. Para se ter uma ideia, uma pesquisa feita nos Estados Unidos mostrou que se uma pessoa SEM dor na coluna gasta em média U$ 2.000,00 ao ano com serviços médicos, um individuo COM dor na coluna gasta cerca de U$ 4.000,00(2). Muitos desses gastos estão relacionados com medicamentos e outros procedimentos que NÃO são eficientes para reduzir a dor, e podem estar associados a efeitos ADVERSOS importantes(3). 

Educação em dor é uma intervenção simples e pode ajudar pacientes com dor lombar crônica: 

Uma intervenção relativamente simples e extremamente segura é a educação moderna sobre a dor. Esse tipo de educação ensina os pacientes como o sistema nervoso funciona em condições de dor aguda e crônica. Estudos tem mostrado que essa intervenção pode reduzir a dor, incapacidade e pensamentos negativos de pacientes com dor lombar crônica(4). No entanto, a quantidade da melhora, quando essa intervenção é realizada isoladamente, costuma ser pequena comparada às expectativas dos pacientes de dor crônica. 

Sugestões hipnóticas podem “conversar” mais facilmente com áreas do cérebro e reduzir a dor em algumas condições: 

Estudos prévios mostram que sugestões oferecidas logo após a indução de um estado de atenção focalizada (ou também conhecido como estado hipnótico) podem ser capazes de mudar mais facilmente a atividade do cérebro e ter maior influência na percepção, motivação e atitudes de uma pessoa. Pesquisas com pacientes também mostram que a hipnose clínica pode ser favorável para redução da dor em diversas condições crônicas como síndrome do colo irritável, fibromialgia, esclerose múltipla e dor orofacial, por exemplo(5). No entanto, poucos estudos haviam investigado a utilização da hipnose clínica em pacientes com dor lombar crônica. 

O primeiro estudo que demonstra que a hipnose clínica pode ajudar pacientes com dor lombar crônica:

Então decidimos realizar um estudo com o objetivo de saber se a utilização de sugestões hipnóticas combinada com a educação moderna em dor poderia reduzir a dor e a incapacidade de pacientes com dor lombar crônica. Para esse estudo pesquisadores da Universidade Cidade de São Paulo, Brasil; Neuroscience Research Australia (NeuRA); e da Universidade de Washington, USA reuniram-se para verificar o efeito de uma intervenção livre de medicamentos – a Hipnose Clínica. 

 Nosso estudo foi recentemente publicado em uma das maiores revistas cientificas em dor(6) – The Journal of Pain. Uma amostra de 100 pacientes com dor lombar crônica participou da nossa pesquisa. Cinquenta pacientes realizaram 4 sessões de educação moderna sobre a dor (utilizando o livro Explicando a Dor) por duas semanas. Outros 50 pacientes receberam a mesma educação sobre dor combinada à hipnose clínica. 

Hipnose clínica e seus efeitos na dor, incapacidade e catastrofização em pacientes com dor lombar crônica:

Nós observamos uma redução da dor e incapacidade em ambos os grupos de pacientes. No entanto as pessoas que receberam hipnose clínica tiveram melhoras significativamente superiores para a dor e incapacidade logo após duas semanas (imediatamente após o programa de tratamento proposto de 4 sessões). Esses efeitos na redução da dor e incapacidade mantiveram-se presentes por 3 meses (período máximo que o estudo propôs avaliar os efeitos da intervenção). Além disso, percebemos que os pacientes que receberam hipnose clínica tiveram significativamente menos catastrofização (pensamentos exageradamente negativos) do que os pacientes que receberam educação em dor isoladamente. 

Em nosso estudo, 69% dos pacientes que receberam hipnose clínica tiveram uma redução clinicamente importante na intensidade da pior dor experimentada na última semana (diminuição de pelo menos 2 pontos na escada de 0-10); comparado com 36% dos pacientes que receberam educação em dor isoladamente. Em relação a incapacidade, 63% dos pacientes que receberam hipnose clínica alcançaram uma melhora clinicamente relevante; comparado a 44% daqueles que receberam a educação em dor isoladamente (diminuição de pelo menos 5 pontos na escala de 0-24). 

Conclusão:
Nosso estudo foi o primeiro a mostrar que a hipnose clínica pode adicionar efeitos à educação em dor a curto e a médio prazo em pacientes com dor lombar crônica. Esses dados tornam-se ainda mais importantes ao levar em consideração que a hipnose clínica é uma intervenção relativamente simples, pode ser realizada em grupo, por qualquer profissional da saúde e sem efeitos adversos importantes. Esses dados nos faz pensar em novas maneiras (opções) de tratar a dor lombar crônica, reduzindo uso de medicamentos e combinando intervenções conhecidas como exercícios, por exemplo, com educação em dor e hipnose.

Referências 
1. Global Burden of Disease Study C. Global, regional, and national incidence, prevalence, and years lived with disability for 301 acute and chronic diseases and injuries in 188 countries, 1990-2013: a systematic analysis for the Global Burden of Disease Study 2013. Lancet. 2015;386(9995):743-800. 

2. Martin BI, Deyo RA, Mirza SK, et al. Expenditures and health status among adults with back and neck problems. JAMA. 2008;299(6):656-664. 

3. Abdel Shaheed C, Maher CG, Williams KA, Day R, McLachlan AJ. Efficacy, Tolerability, and Dose-Dependent Effects of Opioid Analgesics for Low Back Pain: A Systematic Review and Meta-analysis. JAMA Intern Med. 2016;176(7):958-968. 

4. Louw A, Zimney K, Puentedura EJ, Diener I. The efficacy of pain neuroscience education on musculoskeletal pain: A systematic review of the literature. Physiother Theory Pract. 2016;32(5):332-355. 

5. Stoelb BL, Molton IR, Jensen MP, Patterson DR. The Efficacy of Hypnotic Analgesia in Adults: A Review of the Literature. Contemp Hypn. . 2009;26(1):24-39. 

 
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